segunda-feira, 17 de março de 2008

De olho na natureza brasileira

Como questões ambientais brasileiras são vistas no exterior?

“Oficialmente, o objetivo do presidente brasileiro, Luís Inácio Lula da Silva, é alcançar um ‘desmatamento zero’ na Amazônia. Mas o Brasil está muito longe disso”. Com estas palavras pouco otimistas, a correspondente no Brasil do jornal francês Le Monde, Annie Gasnier, iniciou uma das principais reportagens da edição do último dia 1o de março. A constatação se baseia em dados divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) em janeiro desde ano. Segundo o INPE, cerca de sete mil km2 de florestas foram derrubados entre agosto e dezembro de 2007 para ceder espaço à criação bovina e ao cultivo de soja e de cana-de-açúcar. A Amazônia estaria assim sob a pressão da pecuária e do etanol. O presidente Lula pediu à Polícia Federal que tomasse providências. Assim, no dia 26 de fevereiro foi lançada uma operação integrada por 300 homens com o objetivo de combater o desmatamento ilegal no Pará, Mato Grosso e Rondônia, onde a situação é mais preocupante.
De acordo com a matéria, intitulada “Amazônia brasileira: o desmatamento se agrava”, os governantes brasileiros estão encurralados entre dois dilemas, que são a preservação da floresta e o crescimento econômico. Neste sentido, a autora da reportagem argumenta que há uma batalha entre duas mulheres: Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, e Dilma Rousseff, chefe do gabinete da presidência. Gasnier menciona também a longa quilometragem de estradas clandestinas, por onde é transportada a madeira ilegal. De acordo com a jornalista, o Brasil quer “mostrar que se preocupa com a Amazônia, pois teme uma internacionalização da gestão da maior floresta tropical do planeta”. Tal afirmação é sustentada, na matéria, por citação do agrônomo brasileiro Mauro Victor, autor do livro Brasil, o capital natural.
No dia 17 de setembro do ano passado, Le Monde já havia publicado uma matéria intitulada “A Amazônia asfixiada pela soja”, denunciando o plantio do grão em grande escala no estado do Pará, em plena área florestal. No entanto, a Reuters publicou somente em 25 de janeiro deste ano um comunicado a respeito do aumento do desmatamento. Segundo a agência, ambientalistas alertam que a demanda por grãos levará a uma alta da destruição da floresta. No dia 12 de fevereiro deste ano, o diário francês Le Figaro se antecipou ao Le Monde ao estampar o título “Desmatamento recorde da Amazônia brasileira” numa de suas principais reportagens.
Em 1º de janeiro deste ano, o New York Times publicou uma reportagem sobre os problemas gerados pela coabitação da onça-pintada e do gado de corte no Pantanal. Consoantemente às edições francesas sobre a Amazônia, o jornal americano mostrou que a preservação da fauna é pouco respeitada toda vez que há interesses econômicos em jogo.
Frente a este cenário de acusações, parece haver uma dissonância entre o que a mídia brasileira e a estrangeira divulgam sobre questões ambientais do Brasil. Aos brasileiros nunca foi negado o acesso à informação que a Amazônia está sendo desmatada ou que a onça-pintada precisa ser protegida. Contudo, não se pode negar certo descaso do governo quanto à gravidade do assunto. Por outro lado, a imprensa estrangeira parece dramatizá-lo ainda mais, uma vez que não há evidências de que o governo brasileiro realmente tema uma internacionalização da gestão da Floresta Amazônica.
As reportagens dos jornais franceses introduzem o assunto sugerindo que o recuo do desmatamento nos últimos dois anos não poderia durar muito. O desequilíbrio entre lei e fiscalização é apontado como maior vilão da história, o que constitui um ponto de convergência entre a imprensa nacional e a internacional. Ainda assim, algumas colocações tendenciosas problematizam a imagem do meio ambiente brasileiro no exterior. Numa reportagem publicada em 12 de fevereiro deste ano por Le Figaro e intitulada “Um bispo disposto a morrer por um rio”, relata-se a greve de fome de Luís Flávio Cappio em protesto ao desvio do rio São Francisco. Ora, 20% dos comentários enviados pelos leitores da matéria criticam a imprecisão do jornalista e, conseqüentemente, desmistificam a complexidade do projeto. Das oito reações geradas pela reportagem, duas argumentam que não se trata de um desvio total e sim parcial, pois a obre consiste numa punção de dez por cento do rio para a irrigação. Em suma, alguns leitores estão atentos a exageros cometidos por veículos estrangeiros, preocupados em sensibilizar a opinião pública a respeito da incapacidade do governo brasileiro de gerir de forma sustentável seus recursos naturais.
Até que ponto há distorção e exagero por parte da imprensa européia? Até que ponto há omissão e descaso por parte da imprensa brasileira? Estariam leitores franceses e americanos mal informados? Estariam leitores brasileiros bem informados? Diferentemente dos problemas ambientais urbanos, que podem ser presenciados pela grande maioria dos leitores, a preservação da flora e da fauna silvestres precisa ser focada com a maior nitidez possível, já que o olhar dos cidadãos comuns pouco alcança esta realidade.

Por Barbara Cosenza

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