quarta-feira, 14 de maio de 2008

Crônica:

Menino de rua

Vivia na Rua Marechal Deodoro. Era uma criança pobre, ignorante, e condenada. Condenada a um futuro sem futuro, a viver num presente de eterno pedir, de sofrer, de querer, de não ter.
Todos passavam pelo menino e fingiam que ele não existia; que a vida era maravilhosa e que o mundo era perfeito, mas ninguém percebia que a criança fazia parte da realidade, que era um ser concreto.
Ela sempre sonhou em entrar em lojas e ganhar uma roupa nova de alguém piedoso e gentil. Sonhou ter casa, mãe, família, ou qualquer alguém que lhe desse um pouco de carinho, respeito e conforto.
Mas se via presa ao fato de ter nascido sem direito a ter direitos. Enquanto crescia pensava na morte, seria num dia de sol, de frio e de fome e ninguém sentiria a sua falta.
Um dia, um homem passou pela criança e olhou para ela demoradamente. Ele nunca a havia notado. Ele era um homem bom, mas vivia sem tempo para viver. Percebeu mais tarde que todo o dia passava por um menino e nunca dava importância a ele. Então começou a dar-se conta que sua vida estava perdendo o sentido. Pensava ele, “como posso passar por esse garoto todo o dia, ver sua fome, suas roupas rasgadas e fingir que não vejo nada?”.
O homem parou em frente ao menino - os olhos de ambos brilharam - e leu um olhar que assustado pedia, “Por favor, moço me ajude”. Instintivamente o abraçou e sentiu uma paz que jamais havia imaginado que pudera existir. Perguntou o nome e o menino respondeu que se chamava Jesus. Ele não sabia por que havia dito que este era seu nome. Ele nunca teve um nome.
O homem pegou Jesus pela mão, caminhou com ele, os dois conversaram durante muito tempo e deu-lhe de comer. O menino disse, “Senhor, o melhor presente que já ganhei em minha vida foi o seu abraço”. De repente, em meio à multidão soprou um vento forte e o tráfego de pessoas os separou.
Durante muito tempo o homem procurou o menino, mas nunca mais a rua ou o homem puderam ver aquele sorriso. Passados anos, ele foi ao cemitério levar flores a seus falecidos pais. No caminho do jazigo da família viu o túmulo de um indigente com o nome de Jesus.
O homem sentiu um aperto no peito e em pranto ajoelhou-se e arrependeu-se de não tê-lo conhecido antes e feito alguma coisa por ele. Naquele instante o homem percebeu que voltara a ser humano e que alguns dos momentos mais felizes de sua vida não foram dádivas do dinheiro, mas do amor de uma criança.


Larissa Lauffer Reinhardt

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